Terezinha e Gabriela - Ruth Rocha




Gabriela menina, Gabriela levada. Ô, menina encapetada… Gabriela sapeca: 

– Menina, como é que você se chama?
– Eu não me chamo, não, os outros é que me chamam Gabriela.
Gabriela serelepe:
– Menina, para onde vai essa rua?
– A rua não vai, não, a gente é que vai nela.
Gabriela na escola:
– Gabriela, quem foi que descobriu o Brasil?
– Ah, professora, isso é fácil, eu só queria saber quem foi que cobriu. 

Gabriela não deixava a professora em paz:
– Professora, céu da boca tem estrelas?
– Professora, barriga da perna tem umbigo?
– Professora, pé de alface tem calos?
Gabriela era quem inventava as brincadeiras:
– Vamos brincar de amarelinha?
Todo mundo ia.
– Vamos brincar de pegador?
Todos concordavam.
Todos queriam brincar com Gabriela.
Foi aí que mudou, para a mesma rua da Gabriela, a Teresinha.
Teresinha loirinha, bonitinha, arrumadinha. Teresinha estudiosa, vestida de cor-de-rosa. Teresinha. Que belezinha…
Os amigos vinham contar a Gabriela:
– Teresinha tem um vestido com rendinha.
– Teresinha tem uma caixinha de música.
– Teresinha tem cachos no cabelo.
Gabriela já estava enciumada:
– Grande coisa, cachos! Bananeira também tem cachos!
Gabriela não queria nem ver Teresinha:
– Menina enjoada, não sabe correr, não suja o vestido, só vive estudando. Deus me livre!
– Mas ela é boazinha — os meninos diziam.
– Boazinha, nada! Ela é sonsa.
– Mas você nunca falou com ela, Gabriela.
– Não interessa. Não falei e não gostei, pronto!
Mas Gabriela já estava impressionada, de tanto que falavam da Teresinha.
E Gabriela começou a se olhar no espelho e achar o seu cabelo muito sem
graça:
– Mamãe, eu queria fazer cachos nos cabelos.
– Mamãe, eu queria um vestido cor-de-rosa.
– Mamãe, eu queria uma caixinha de música.
E Gabriela começou a se modificar.
Na escola, no recreio, Gabriela não pulava corda e nem brincava de esconde-esconde. Ficava sentadinha,quietinha, fazendo tricô. 

De tarde, Gabriela não ia mais brincar na rua para não sujar o vestido.
E, à noite, muito em segredo, Gabriela enchia a cabeça de papelotes para
encrespar os cabelos.
Os amigos vinham chamar Gabriela:
– Gabriela, vamos andar de bicicleta?
– Agora eu não posso — respondia Gabriela. — Preciso ajudar a mamãe.
A mamãe de Gabriela estranhava:
– Que é isso, menina? Você não tem nada para fazer agora.
E Gabriela, com ares de gente grande, respondia:
– Eu já estou crescida para essas brincadeiras…
E Teresinha?
O que é que estava acontecendo com Teresinha?
Teresinha só ouvia falar de Gabriela:
– Gabriela é que sabe pular corda.
– Gabriela usa rabo-de-cavalo para o cabelo não atrapalhar.
– Gabriela só usa calças compridas.
Teresinha respondia com pouco-caso:
– Que menina mais sem modos! Deus me livre…
Mas, quando as crianças saíam, Teresinha pedia:
– Mamãe, eu quero umas calças compridas.
E, no fundo do quintal, Teresinha treinava, pulando corda e amarelinha, para ir brincar na rua, como Gabriela. 

E, na primeira vez que as duas se encontraram, a turma nem queria
acreditar.
Gabriela, fazendo pose de moça, cabelos cacheados, sapatos de
pulserinha, vestido todo bordado.
Gabriela empurrando o carrinho da boneca, comportadíssima.
Teresinha pulando sela, assoviando, levadíssima.
As duas se olharam, no começo, desconfiadíssimas.
Depois, começaram a rir porque estavam mesmo muito engraçadas.
Agora, Teresinha e Gabriela são grandes amigas.
Cada uma aprendeu muito com a outra.
Gabriela sabe a lição de história do Brasil, embora seja ainda a campeã
de bolinha de gude.
E teresinha, embora seja ainda uma boa aluna na escola, já sabia andar
de bicicleta, pular amarelinha, e até já estava aprendendo a fazer suas
gracinhas.
Ontem, quando a professora perguntou a Teresinha:
– Minha filha, o que você vai ser quando crescer?
Teresinha teve dúvidas:
– Vou ser grande, ué!



Comentários

  1. historia muito boa muito legal vou levar para escola e vou ler par os meus alunos

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  2. Gostei muito de reever está história, eu era bem pequena quando li ela pela primeira vez!

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  3. Eu quero é resposta. Nao e a questão não

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  4. Olá, Débora! Obrigada por compartilhar histórias!! Fiz a leitura do poema "Pessoas são diferentes" de Ruth Rocha para meus alunos do 6ºano, discutimos sobre a celebração da diversidade e valorização das diferenças entre as pessoas. Achei bacana ler esse texto para eles também. Você pode me passar a referência? Obrigada!

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