O Gambá e o Jarro de Leite - Ricardo Azevedo




O gambá vivia escondido num buraco em cima de uma árvore.
Toda noite, depois que o fazendeiro ia dormir, o danado saía da toca e desandava a fazer coisa errada. Roubava e comia as frutas do pomar. Entrava na cozinha e bebia cachaça.
Brigava com o gato. Arrombava a porta do galinheiro, chupava os ovos e ainda matava um monte de galinhas.
Um dia, o gambá encontrou um jarro cheio de leite e logo teve uma ideia. Mandou fazer um paletó, botou o jarro na cabeça e foi embora para a cidade.
“Vou trocar o jarro por duas dúzias de ovos”, pensou o gambá. “Dos ovos vão nascer vinte e quatro pintinhos. Os pintinhos vão crescer e virar vinte e quatro frangos. Vou vender meus frangos e com o dinheiro compro um boi e três vacas.”
O gambá sorria andando pela estrada de terra com o garrafão no alto da cabeça.
“Do boi e das três vacas vão nascer muitos e lindos bezerrinhos. Vou criar os bezerros para vender e depois comprar mais bois e mais vacas. Quando a minha criação de gado ficar bem grande, vendo tudo e compro uma fazenda.”
O gambá sonhava.
“Minha fazenda vai ser das grandes.”
E o bicho andava, e andando via a fazenda na sua frente.
“Ali”, apontava ele com o dedinho no espaço, “vai ser o pomar cheio de frutas deliciosas”. “Mais pra lá”, mostrava ele com a outra mão, “vou construir um curral. Em cima daquele morro, assim, vai ser o pasto para a criação de gado.
Minha casa vai ficar bem ali, perto do lago. Vou ter ovos, pois pretendo construir um galinheiro.”
O gambá ria sozinho:
“Vou ficar rico. Vou ter um baú cheio de dinheiro”.
E ria mais:
“Fora isso, vou mandar plantar bastante cana para fazer cachaça só para mim!”.
E o malandro já se imaginava de bota de couro e chapéu de abas largas, fumando charuto e andando para lá e para cá, mandando e desmandando na sua fazenda imensa.
Sonhou tanto que acabou tropeçando numa pedra. O jarro escorregou e se espatifou no chão.
O gambá ficou parado olhando o leite derramado. Depois, voltou para o seu buraco em cima da árvore, pegou uma violinha de dez cordas e cantarolou:
Minha gente eu tive um sonho
Quis do nada fazer renda
Sonhei que de um simples jarro
Eu tirava uma fazenda
Sem trabalho nem esforço
Só na manha e na moleza
Quis ter dinheiro e fortuna
Que ser rico é uma beleza!
Mas foi tudo uma miragem
Bem no meio do caminho
Bem no meio da viagem
Uma pedra fez seu ninho
Que tristeza, minha gente
Por causa de um tropeção
Lá se foi minha esperança
Meu sonho quebrou no chão
Adeus, frutas do pomar
Adeus, gado e galinheiro
Adeus, fazenda e cachaça
Adeus, baú de dinheiro
Agora vivo a cantar
Que chorar não me consola
Perdi fazenda e dinheiro
Mas guardei minha viola!

Fonte:
Azevedo, Ricardo. Histórias que o povo conta : textos de tradição popular. São Paulo : Ática, 2002. – (Coleção literatura em minha casa ; v.5)

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